A Associação das Empresas Cerealistas do Brasil (Acebra) está alertando o setor rural para riscos jurídicos que podem ser gerados a partir da proposta de criação da Política Nacional de Proteção ao Produtor Rural, que está em discussão na Câmara dos Deputados. O Projeto de Lei 4588/2021, de iniciativa do deputado federal Sergio Souza (MDB/PR), já tem parecer pela aprovação na Comissão da Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural. Para a Acebra, “a análise do texto revela pontos que exigem cautela, sob o risco de gerar o efeito inverso, ampliando a insegurança jurídica e prejudicando, especialmente, o pequeno e médio produtor rural”.
O diretor executivo da entidade, Roberto Queiroga, e o assessor jurídico, Carlos Parreira, fazem ponderações sobre o tema.
“Um ponto crítico reside na percepção subjacente a diversos artigos de que o produtor rural é hipossuficiente, necessitando de tutela exacerbada do Estado. A intervenção estatal, embora importante em cenários específicos, quando generalizada, pode fragilizar as relações jurídicas no setor e criar um ambiente de negócios imprevisível e pouco atrativo para investimentos”, afirmam, em artigo divulgado pela Acebra.
Conforme os autores, um exemplo do risco está na redação do Artigo 9º, que trata da proteção contratual. Queiroga pontua que, ao prever a nulidade de pleno direito de cláusulas consideradas desfavoráveis ao produtor rural, abre-se espaço para revisões contratuais com consequências diretas no crédito rural. “A simples alegação de desequilíbrio contratual, sem delimitação objetiva, pode levar à judicialização excessiva, paralisando negócios e investimentos no campo”, afirma. Para Parreira, a inserção de expressões como “ou quando demonstrado evidente desequilíbrio”, proposta pela relatoria, não soluciona o problema da subjetividade, perpetuando a insegurança jurídica.
Crédito
Outro ponto apontado considerado sensível é a restrição à consulta de registros de restrição de crédito, prevista no Artigo 24, Inciso III. Para a Acebra, a intenção de evitar discriminações e facilitar o acesso ao crédito pode resultar em recusa tácita por parte dos bancos ou fornecedores de insumos, que podem negar o financiamento pela impossibilidade de avaliar o risco de crédito. Os autores dizem que seria louvável a criação de um Fundo Garantidor de Risco de Crédito para micro e pequenos produtores, mas falta detalhamento e informações sobre a origem de recursos, gestão e critérios de elegibilidade, que gera incertezas sobre sua real efetividade e potencial impacto nas contas públicas.
Os representantes da Acebra entendem que o financiamento da atividade agrícola no Brasil tem se tornado cada vez mais complexo e dependente da iniciativa privada. Na sua avaliação, o PL cria uma grave distorção ao impor a cerealistas e outros agentes do mercado agro o ônus de suportar o risco da atividade agrícola sem poder repassar os efeitos contra seus financiadores como bancos e fornecedores. “Isso sem dúvida restringirá e encarecerá o financiamento ofertado ao produtor rural fora do ambiente financeiro e dos planos de apoio governamental, como o Plano Safra”, ponderam.
A Acebra defende que a Câmara dos Deputados amplie o debate sobre a proposta e envolva todos os atores envolvidos, como bancos, fornecedores de insumos e produtores rurais.
“A busca por uma legislação que proteja o produtor rural sem criar insegurança jurídica exige cautela, precisão técnica e bom senso. É preciso garantir que a legislação não infantilize o setor, mas sim o fortaleça, reconhecendo sua importância estratégica para o país e sua capacidade de atuar de forma autônoma e competitiva no mercado”, finaliza.
A reportagem procurou o deputado Sergio Souza para comentar o posicionamento da Acebra e mantém o espaço aberto para sua manifestação.
Correio do Povo