Em um ano marcado pelos efeitos da inundação na economia e no mercado de trabalho, o número de novos negócios individuais avançou no Rio Grande do Sul. Após anotar o maior total de registros para um mês de agosto, a abertura de microempreendedores individuais (MEIs) cresceu 4% no acumulado do ano no Estado. Os dados são da Junta Comercial, Industrial e Serviços do RS (JucisRS). Necessidade de formalização para acessar clientes e benefícios e de fonte de renda após impacto da inundação nos empregos formais ajudam a explicar esse movimento, segundo especialistas.
De janeiro a agosto, foram registrados 135.810 MEIs no Estado. No mesmo período do ano passado, 130.529 negócios dessa natureza abriram em solo gaúcho. Ou seja, 5.281 a menos. O montante observado no agregado deste ano é o maior para esse recorte de tempo desde 2021 (137.121), ano marcado pelo início do processo de saída da pandemia. Somente em agosto de 2024, foram constituídos 18.765 MEIs no Estado, maior total para esse mês na série histórica desde 2009.
A presidente da JucisRS, Lauren Momback Mazzardo, comenta que o aumento representa o crescimento econômico no pós-enchente. De acordo com ela, o programa MEI RS Calamidades é uma parte das respostas às cheias, que “demonstra uma estratégia eficiente para incentivar a recuperação da economia”:
— É importante ressaltar que não são só os números do MEI que cresceram, as sociedades limitadas e sociedades anônimas seguem no mesmo sentido, reforçando a confiança do setor privado na recuperação do estado. A economia está se recuperando, se reestabelecendo e quem ganha com isso é o povo gaúcho. Estes números demonstram a força do empreendedorismo gaúcho que cresce com a força do seu trabalho, se adaptam e superam adversidades, consolidando como um estado empreendedor de inovação e dinamismo econômico.
Giulia Mattos, especialista em MEI no Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas no Estado (Sebrae-RS), afirma que esse aumento nos empresários individuais também pode captar alterações entre empreendedores. Diante da urgência de restabelecer a operação e renda, parcela das pessoas que mantém pequenos negócios busca a formalização para conseguir apoio financeiro para sobrevivência da empresa, segundo a especialista:
— Foram disponibilizadas linhas de crédito, com juros diferenciados, com condições facilitadas, incentivos dos mais diversos para pequenas empresas, microempreendedores. E esse tipo de apoio financeiro também pode estimular que mais pessoas se formalizem, que mais negócios, que antes estavam informais, vejam nesses benefícios uma oportunidade de formalização.
Vanessa Batisti, professora da Escola de Gestão e Negócios da Unisinos, lembra que o Estado fechou cerca de 30 mil vagas com carteira assinada no acumulado de maio e junho deste ano, meses sob forte impacto da inundação na economia. Com a necessidade de garantir renda, parte dessas pessoas que perderam o emprego formal pode enxergar no MEI uma solução emergencial, segundo a professora
— Esses 30 mil gaúchos que saíram do mercado de trabalho entre abril e junho não voltaram. Alguns podem ter constituído o seu registro como microempreendedor individual para poder atuar, porque é uma modalidade menos burocrática, menos custosa, mais tranquila de se lidar e a pessoa consegue se auto-empregar.
A professora lembra que o maior número de MEIs ingressando no mercado também pode afetar a economia e o consumo. Como parte dos empreendedores não tem a mesma previsibilidade orçamentária que tinha quando trabalhava de carteira assinada, pode existir um freio nas compras de itens não essenciais.
Pelo lado dos fechamentos, a extinção de MEIs cresceu de 67.897, em 2023, para 75.799, em 2024 — alta de 11,6%. No entanto, o total segue abaixo do número de aberturas, o que garante saldo positivo na criação de empresas desse tipo.
Próximos meses
A especialista em MEI do Sebrae-RS, Giulia Mattos, estima que esse ambiente mais aquecido nos MEIs deve seguir nos próximos meses. Nesse sentido, destaca a importância da busca por especialização e orientação de órgãos especializados, como o Sebrae, diante da proximidade de datas festivas, que movimentam a economia. Giulia afirma que a normalização no processo de criação de novos MEIs deve ficar para o próximo ano:
— Diria que a estabilização dos padrões pode demorar um pouco mais. Acho que a gente vai se encaminhar para o início desse processo agora, mas teria uma normalização lá pelo segundo semestre de 2025.
A professora Vanessa Batisti cita que a dinâmica de retomada segue no Estado em um cenário onde ainda não superamos todos os efeitos da inundação. Nesse sentido, ainda existe espaço para avanço no número de abertura de MEIs:
— Acredito que ainda possa ter um crescimento no número de microempreendedores individuais porque a gente ainda está nessa fase de reconstrução. Mas com tendência daqui a pouco de estabilizar, porque as empresas também estão se reconstruindo.
Inscrição estadual
Todos os MEIs em atividade que são contribuintes do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no Rio Grande do Sul passarão a ter Inscrição Estadual (IE) a partir de outubro. A medida inclui mais de 400 mil MEIs no Estado com CNPJs vinculados a atividades comerciais e industriais, segundo dados da Secretaria da Fazenda (Sefaz).
O cronograma do governo projeta a inscrição estadual para todos os MEIs ativos no dia 1º de outubro. A mudança não traz novas obrigações tributárias aos MEIs, que continuarão pagando os mesmos valores de impostos e preenchendo os mesmos documentos. Na avaliação do governo, a medida busca ampliar as oportunidades de negócios para esses empreendedores, especialmente em transações interestaduais. O número de IE poderá ser consultado no site da Receita Estadual.
O modelo de MEI
Criado em 2008 e com operação iniciando em 2009, O modelo MEI permite a formalização de negócios de pequeno porte com simplificação nos trâmites e na tributação. O processo de abertura é centralizado e organizado pelo governo federal.
- O MEI pode faturar, no máximo, R$ 81 mil por ano
- O MEI não pode participar de outra empresa como sócio ou titular
- Pode ter, no máximo, um empregado que receba o piso da respectiva categoria ou um salário mínimo
- A empresa é enquadrada no Simples Nacional e fica isenta de tributos federais, como Imposto de Renda, PIS, Cofins, IPI e CSLL.
- O microempreendedor individual precisa pagar, mensalmente, taxas de R$ 71,60 (comércio ou indústria), R$ 75,60 (prestação de serviços) ou R$ 76,60 (comércio e serviços)
- Permite ao microempreendedor acesso a direitos como aposentadoria (por idade ou por invalidez) , auxílio-doença e auxílio-maternidade.
GZH