Médicos conseguem “reescrever” DNA em tratamento inédito e curam bebê de doença rara; entenda como é feito
Criança nasceu com doença rara causada por mutação genética — Foto: Divulgação
SAÚDE | Tratamento revolucionário reescreve o DNA e dá esperança para milhões com doenças raras
Um bebê norte-americano tornou-se símbolo de uma revolução médica ao ser curado de uma doença genética rara com um tratamento experimental de edição de DNA. Kyle, de apenas dois anos, foi o primeiro paciente do mundo a receber uma terapia genética capaz de corrigir uma única “letra” defeituosa de seu código genético – uma inovação que pode mudar o futuro da medicina.
Kyle nasceu aparentemente saudável, mas logo nos primeiros dias apresentou sinais preocupantes: letargia, recusa alimentar e dificuldade em manter a temperatura corporal. Aos sete dias de vida, veio o diagnóstico: deficiência de CPS1, uma condição genética extremamente rara que afeta o metabolismo e pode causar danos irreversíveis ao fígado e ao cérebro. A doença acomete apenas um em cada 1,3 milhão de bebês.
Reescrevendo o destino
Diante do prognóstico sombrio, os pais de Kyle autorizaram sua participação em um estudo pioneiro conduzido na Pensilvânia, nos Estados Unidos. Os cientistas, liderados por pesquisadores do Hospital Infantil da Filadélfia (CHOP), buscavam corrigir a mutação com uma tecnologia chamada edição de base, que permite substituir uma única letra do DNA em um ponto exato.
Para isso, desenvolveram um medicamento injetável personalizado, criado especificamente para o erro genético de Kyle. A infusão, que dura cerca de duas horas, foi aplicada três vezes até agora – com resultados animadores: o menino passou a tolerar proteínas, teve progressos significativos no desenvolvimento e apresenta melhora sustentada na função hepática.
“Erro de ortografia” genético
O caso chama a atenção por um detalhe técnico e poderoso: a mutação que ameaçava a vida de Kyle era causada por um único erro entre os mais de 3 bilhões de pares de bases que compõem o DNA humano. Com o avanço da terapia genética, esse tipo de “erro de ortografia”, antes impossível de corrigir, passa agora a ser tratável.
“Minha esperança é que, um dia, nenhum paciente com doenças raras morra prematuramente por mutações genéticas que podemos corrigir”, afirmou o pesquisador Kiran Musunuru, da Universidade da Pensilvânia, um dos cientistas envolvidos no tratamento.
Futuro promissor, mas com limites
Embora a terapia tenha se mostrado eficaz para doenças que afetam o fígado – devido à facilidade de entrega das instruções genéticas ao órgão –, os pesquisadores acreditam que, no futuro, a mesma abordagem poderá ser usada em doenças neurológicas e musculares, como a distrofia muscular.
Ainda não está claro se Kyle precisará continuar recebendo a terapia ao longo da vida, mas os médicos já consideram o caso como uma reversão clínica da doença. As doses do medicamento estão sendo reduzidas progressivamente, indicando uma resposta positiva e duradoura ao tratamento.
O caso de Kyle é mais do que uma vitória médica: é um vislumbre do que a medicina de precisão pode alcançar nas próximas décadas.

