A principal tradição culinária do país, a combinação de feijão com arroz, encerrou o mês de dezembro com preços em alta e incertezas sobre o abastecimento interno desses itens ao longo de 2024. Problemas climáticos em regiões produtoras dos dois grãos e dificuldades em países exportadores de arroz impactaram a oferta em 2023, resultando no aumento dos valores desse prato típico brasileiro. Segundo o analista Evandro Oliveira, da consultoria Safras & Mercado, a tendência é que o clima irregular contribua para manter os preços elevados no início deste ano.
No caso do arroz, o consultor explica que a valorização atual da commodity reflete a oferta menor, devido à redução da área de cultivo do cereal na safra 2022/2023 e à migração dos produtores para outras culturas mais rentáveis, como a soja. Além disso, houve perdas decorrentes de estiagem no Rio Grande do Sul, principalmente na Fronteira Oeste. A alta também é explicada pelo bom ritmo das exportações brasileiras do grão, mesmo que inferiores às de 2022. De acordo com dados da Associação Brasileira da Indústria do Arroz, os embarques somaram 1,7 milhão de toneladas de janeiro a novembro do ano passado. Oliveira afirma: “Devemos chegar em fevereiro com os menores estoques em aproximadamente 15 anos”.
O analista observa que a disparada de preços do cereal é um fenômeno mundial. Em julho passado, a Índia, principal exportador global da commodity, proibiu as exportações de arroz branco não basmati, numa tentativa de conter a alta de preços internos. A Tailândia, segundo maior fornecedor, enfrenta uma seca que poderá reduzir sua oferta. Oliveira explica: “Neste momento, em plena entrada de safra no continente asiático, os preços seguem subindo. É o mundo dando sinais de que precisa de mais arroz e, no Brasil, o cenário não é diferente”.
Quanto ao feijão, cultivado no Brasil em três safras, o consultor diz que a oferta sofre os efeitos do clima adverso tanto na Região Sul quanto em outros estados, como Minas Gerais e Bahia. “O mercado está muito preocupado devido aos atrasos da primeira safra, que podem prejudicar a janela de plantio para a segunda safra, em meados de abril, e isso vai se refletir nos preços”, destaca Oliveira. No Paraná, que já iniciou a colheita da primeira safra, a Secretaria da Agricultura estima perdas de 18% das lavouras devido ao excesso de chuvas atribuído ao fenômeno El Niño. “O Paraná é o principal fornecedor de feijão preto nesta época, então vamos depender ainda mais das importações da Argentina”, observa o analista.
Segundo Oliveira, há uma escassez generalizada no mercado de feijão de melhor qualidade, conhecido como feijão extra, com classificação 9 e 9,5, o que tem mantido os preços elevados. “A maior parte do feijão que tem chegado está com alto teor de umidade ou muito ressecado, com classificação entre 8,5 e 8. Esperava-se que o feijão extra operasse abaixo de R$ 300 no início da colheita. No entanto, na Bolsinha (atacado paulista), o feijão carioca e o preto terminaram o ano com preços iguais, ambos na faixa de R$ 345 por saca”, afirma o consultor.
Cotações no Estado.
No Rio Grande do Sul, a saca de arroz de 50 quilos está custando R$ 123,20; a de soja de 60 quilos é negociada a R$ 134,78; e a saca de feijão de 60 quilos está cotada a R$ 283,40, de acordo com levantamento da Emater/RS-Ascar de 28 de dezembro.
A inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE, aumentou 0,28% em novembro. No grupo alimentação e bebidas, que teve maior peso na alta, o arroz e o feijão preto foram alguns dos itens que mais subiram, respectivamente, 3,63% e 4,18%.